terça-feira, 23 de julho de 2013

AMEAÇA AO ESTADO LAICO


                Quero muito mesmo, de verdade, que Deus (tenha Ele o nome ou a atribuição que tiver) realmente exista, ou que ainda se acredite nisso por bastante tempo. Parece-me que é última fonte de respeito da humanidade. Até as mães estão aparentemente perdendo a honraria, infelizmente. Estamos próximos da afirmação de Dostoiévsky no clássico Irmãos Karamazov: “se Deus não existe, então tudo é permitido.” Não acho que se deva chegar a tanto.

                Não ter uma referência de respeito e obediência e diante de um ordenamento jurídico em que imperam leis injustas, ultrapassadas e impunidade, deságua-se num sistemático desrespeito a tudo e a todos. Deus ainda continua ocupando um lugar de destaque nesse aspecto, sendo respeitado ou até mesmo temido por sujeitos de todo o mundo. Essa é uma das facetas da fé.

                No entanto, como jurista, não posso admitir a confusão da ideia de ilícito com a ideia de pecado, nem mesmo admitir qualquer diploma religioso (bíblia, alcorão, tora etc) como norma vinculante ou ainda interferência ou participação direta de entidades religiosas na tomada de decisões estatais ou na criação e interpretação da normatividade.

                É e espantosa e absurda, portanto, a idéia da PEC 99 que pretende estender o rol do artigo 103 da Constituição da República e dar legitimidade a entidades religiosas para propositura de ações diretamente no Supremo Tribunal Federal, discutindo a constitucionalidade de leis. Nenhuma teocracia é bem vinda, ainda mais capitaneada por igrejas muitas vezes de idoneidade duvidosa.

                Tem sido dito, embora a ouvidos aparentemente surdos, de maneira bem abrangente, já que em nosso país só se sabem das coisas pela mídia duvidosa, que o Brasil é um Estado laico, ou seja, não adota qualquer religião oficial nem se submete a qualquer outro ordenamento que não seja o ordenamento jurídico estatal. Parecem não se importar com isso, escudados por uma “bancada” no congresso nacional.

                É necessário, em nome da defesa desse incontestável Estado laico, que se coloquem as religiões no seu devido lugar, qual seja, a órbita privada. Transformar dogmas e doutrinas religiosas em questões de razão pública é invadir a seara exclusiva do poder público e desrespeitar a laicidade de nosso pais. Em tempos de visita papal, a discussão parece pertinente, embora muitos estejam deslumbrados com a presença do pontífice e deixem isso de lado.

Um comentário:

  1. Bernardo, concordo com você. Imaginei que daria pra uma entidade religiosa ajuizar ADI, mas o inciso IX do art. 103 da CF fala em entidade de classe ou confederação sindical de âmbito nacional. Não dá e não tem que ser legitimada mesmo. Se quiser discutir a constitucionalidade de uma lei, que peticione gratuitamente ao PGR, para que esse, se entender plausível o pleito, ajuíze a ADI. Ou ainda se valha de um partido político. Muito bom também!

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