Como a grande maioria da
população não lê praticamente nada (parece ter uma verdadeira ojeriza a livros,
anoto), não teve o devido destaque e, via de consequência, o devido lamento e a
tomada de consciência do risco da falta de substitutos, a morte, com diferença
de poucos dias, de três gigantes da literatura brasileira: João Ubaldo Ribeiro,
Rubem Alves e Ariano Suassuna.
Suassuna
ainda angariava mais admiradores modernos, sobretudo por sua singular verve
irônica, pelo Auto da Compadecida (famoso na TV) e pela associação com o
futebol, nada muito literário, infelizmente. Mas tanto ele, quanto os outros
que também se foram, têm muito mais coisa boa para se conhecer. E é sobre um
texto de Ariano Suassuna que se irá comentar, até mesmo à guisa de homenagem,
pois, como acontece normalmente com os clássicos, está cada vez mais atual.
É
comum se dizer que não existe mais esquerda e direita. Quem diz isso
normalmente é de direita e é, sem dúvida, um subterfúgio para se fugir da discussão,
esvaziá-la e tentar se igualar todo mundo. E está absolutamente errada essa ideia.
Pode não haver mais entre partidos políticos as divisões entre esquerda e
direita, já que se transformaram em clones uns dos outros, guiados muito mais
por interesses internos (escusos) do que externos, contrariando sua essência de
representatividade e seu papel instrumental.
Há
ainda, sem dúvida, e como muito bem delineou Suassuna, homens de esquerda e de
direita, independentemente de partidos ou da prática política. Os ideais
permanecem. Com um viés religioso, mas inteligente, para analisar, o autor paraibano
leva em conta a questão da justiça com os desvalidos para separar esquerda e
direita, com óbvia desvantagem, por sua própria essência, para esta última.
Ariano
afirma que “Herodes e Pilatos eram de direita, enquanto o Cristo e são João
Batista eram de esquerda. Judas inicialmente era da esquerda. Traiu e passou
para o outro lado: o de Barrabás, aquele criminoso que, com apoio da direita e
do povo por ela enganado, na primeira grande “assembléia geral” da história
moderna, ganhou contra o Cristo uma eleição decisiva. De esquerda eram também
os apóstolos que estabeleceram a primeira comunidade cristã, em bases muito
parecidas com as do pré-socialismo organizado em Canudos por Antônio
Conselheiro. Para demonstrar isso, basta comparar o texto de são Lucas, nos
“Atos dos Apóstolos”, com o de Euclydes da Cunha em “Os Sertões”.”
E
conclui, de forma magistral: “no Brasil atual, outra maneira fácil de manter
clara a distinção é a seguinte: quem é de esquerda, luta para manter a
soberania nacional e é socialista; quem é de direita, é entreguista e
capitalista. Quem, na sua visão do social, coloca a ênfase na justiça, é de
esquerda. Quem a coloca na eficácia e no lucro, é de direita.”
A
grande diferença matricial entre esquerda e direita está justamente nisso.
Enquanto a direita luta pela liberdade (em sentido amplo), a esquerda luta pela
liberdade aliada à igualdade. Não há liberdade na diferença. Não há aferição de
mérito na disputa entre desiguais. Não há justiça sem as mesmas condições para
todos. E, ainda, não há mais a Casa Grande e a Senzala. É essa a essência da
esquerda, não dos supostos partidos de esquerda. E é isso que as pessoas teimam
em não querer enxergar, ou, propositalmente, por uma contaminação midiática,
preferem confundir. Obrigado, Ariano Suassuna.
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